|Por Gleide
Fraga, do Blog Feminismo sem Demagogia
A
questão da apropriação cultural nasce de uma perspectiva vista há algumas
décadas atrás, mas pouco se debate a respeito desse assunto, porque muitas correntes
pós-modernas desconsideram a origem da apropriação em si, gerando um
questionamento generalista e que confunde as questões que envolvem o que seria
e como se difunde a apropriação cultural.
É
importante o debate acerca da valorização de uma cultura, seja ela para que
valores ancestrais permaneçam, seja para que o percurso tomado pela humanidade
não perca a história de um povo, seja pra que a história desse povo prevaleça
como uma forte idealização de identidade cultural para os herdeiros dessa cultura.
O
que poucos sabem, mas já aconteceu e ainda acontece, é que várias culturas
morrem não só porque seus adereços foram banalizados; e sim porque sua história
foi esquecida através do esmagamento de outras culturas que se intitulam
“dominantes”.
A
dominância de uma cultura se dá neste momento através dos meios de
industrialização, e é assim que a cultura eurocêntrica vende e enriquece
através da apropriação cultural. Inserindo modelos eurocêntricos na história de
povos que foram de alguma forma, dominados pela escravidão ou pela colonização.
No
mundo, houveram várias manifestações da apropriação cultural, em movimentos
sociais marcados pela arte através da música, como o rock que foi criado
através de uma perspectiva de manifestações pelo movimento negro, e hoje abriga
inclusive, vertentes fascistas e é tido como um ritmo racista que não abre mais
margem para o público negro; através da religião que foi deturpada por
elementos de religiões europeias; e embranquecimento da história de povos que
construíram grandes histórias e realizaram grandes feitos pelo seu povo. Um
grande exemplo disso foi o povo egípcio, grandes conhecedores de engenharia,
matemática, física, e inclusive medicina, cujo “pai da medicina” título
atribuído por Hipócrates, na verdade é um estudo que foi copiado de Imhotep que
era Egípcio. O povo egípcio construiu grandes monumentos imortalizados, e mesmo
assim, há uma grande dúvida acerca de que eles realmente tinham conhecimento
para construção destes monumentos, por serem negros, há uma enorme necessidade
de apagamento na história de inteligência e astucia desse povo.
No
Brasil, essa modalidade de apagamento da nossa cultura, religião, culinária e
adereços utilizados como forma de resistência e enfrentamento nos séculos de
escravidão, se dá através da indústria da moda e da mídia, que banaliza
aspectos culturais afrocentrados, desfazendo as ideias do que esses adereços
trazem, banalizando esses aspectos e os diminuindo à mera utilização de moda.
Isso apaga debates culturais importantes na história do Brasil, debates que
colaboram para o enriquecimento cultural e impulsiona uma soberania
eurocêntrica, trazendo ao senso comum, a ideia equivocada de que a nossa
cultura não tem nenhuma relevância histórica colaborada pelo povo negro e
indígena.
Assim,
enxergamos como a indústria de moda que gera uma falsa demanda de utilização de
adereços culturais, influencia o impulso da banalização de uma cultura; mas
como poderíamos culpar pessoas nessa apropriação? É necessário entender que uma
pessoa branca por si só não tem potencial de apropriar-se de toda uma extensão
cultural, apenas por utilizar turbante ou dreadlocks, é impossível que uma
única pessoa gere apagamento de toda uma cultura continental ou de um povo
através da utilização de um adereço. Muito se debate que uma pessoa colabora
para o impulso da comercialização destes produtos como meramente adereços de
moda, mas vejamos o quanto isso se torna improvável. É impossível que uma única
pessoa influencie toda uma indústria a continuar produzindo produtos culturais
como adereços sem importância, porque é justamente o contrário que acontece.
Nós somos todos influenciados a consumir, somos máquina de produção e consumo
do capitalismo, somos 99% da população mundial que produz dinheiro e consome
para que os outros 1% enriqueçam em cima da nossa produção e consumo.
Desta
forma, a indústria midiática, da moda, musical, influencia toda uma questão de
consumo para nós pessoas normais através do senso comum nos utilizarmos de
adereços de relevância cultural, como moda e comportamento passageiros.
É
importante não nos esquecermos do peso racista que traz a apropriação, porque
quando uma pessoa negra se utiliza de seus elementos culturais, ela é vista
depreciativamente, ao passo que quando uma pessoa branca utiliza, há sempre uma
perspectiva positiva com relação à atitude da mesma, fazendo com que haja
higienização na utilização de adereços culturais, trazendo benefício apenas a
pessoas brancas e fazendo com que pessoas negras sejam sempre preteridas por se
utilizarem de sua própria cultura. A indústria trabalha esse racismo, trazendo
a falta de representatividade dentro desses aspectos culturais, colocando
pessoas brancas para utilizarem turbante, cantores brancos na cultura hip-hop,
como uma forma de popularizar a cultura negra de forma higienizada, banalizando
a cultura negra, sem os seus representantes, apagando da história dessa
cultura, seus verdadeiros protagonistas.
A
priori, devemos culpar socialmente o racismo que a apropriação traz como um
viés de opressão contra o povo que é “dono” daqueles aspectos culturais, mas a
ponto de partida mais amplo, devemos nos ater o quanto nós podemos andar em
círculos na questão da apropriação cultural, culpar uma única pessoa pela
utilização de um adereço, pode ser uma forma ineficiente de combater o
apagamento cultural gerado única e exclusivamente pela cultura dominante.
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